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Prefácio a Desenvolvimento numa Perspectiva Keynesiana

Luiz Carlos Bresser-Pereira

Prefácio a "Desenvolvimento numa Perspectiva Keynesiana", de José Luis Oreiro.

Oreiro writes an excellent summary-analysis of the development macroeconomics models before the New Developmental model to which he is one of the main contributors.


 



 





José Luis Oreiro é o mais brilhante economista brasileiro de sua geração. Escreve com clareza e precisão, domina de forma segura a teoria econômica e é dotado da matemática necessária para formalizar essa teoria. Essas qualidades estão presentes em seu livro, "Desenvolvimento numa Perspectiva Keynesiana", no qual nos apresenta de maneira original os principais modelos da macroeconomia do desenvolvimento. Apresenta-os, como o título do livro já informa, a partir da visão keynesiana, o que significa que ele rejeita a tese clássica que a oferta cria a sua própria procura, e a tese neoclássica que a substituição entre os fatores de produção é perfeitamente elástica. Para ele como para todos os keynesianos e desenvolvimentistas, o mercado não garante pleno emprego, e o desenvolvimento econômico é essencialmente puxado pela demanda.

Já na introdução ele faz uma opção entre os dois fundadores da macroeconomia – Keynes e Kalecki – a favor do primeiro. Oreiro não nega o papel fundamental que teve Kalecki na teoria econômica, mas, nos modelos kaleckianos prevalece uma baixa sensibilidade do ritmo de acumulação de capital às divergências entre o grau efetivo e desejado de utilização da capacidade produtiva, o que não parece ser o que se verifica na prática. Além disso, nos modelos kaleckianos com oferta ilimitada de trabalho, como é o caso do modelo de Bhaduri e Marglin, o investimento é função da participação dos lucros na renda e do grau de utilização da capacidade produtiva, ao invés de ser consequência da taxa de lucro esperada menos o custo de capital. É essa premissa discutível que lhes permite afirmar que, se esta participação for muito baixa, o regime de crescimento será do tipo profit-led, enquanto que para níveis elevados de participação dos lucros na renda o regime de acumulação será do tipo wage-led.

Oreiro apresenta e critica os modelos neoclássicos de crescimento com progresso tecnológico tanto exógeno quanto endógeno. Sua principal crítica está no fato que o modelo neoclássico pressupõe um progresso técnico “desencorpado”, ou seja, independente do investimento em máquinas e equipamentos. Além disso, ele observa que, ao contrário do que afirma essa teoria, o componente cíclico da atividade econômica, que está associado às variações da demanda agregada, afeta o crescimento de longo prazo. Em outras palavras, em termos muito keynesianos, o longo prazo é a soma dos crescimentos no curto prazo. Oreiro se associa aos economistas keynesianos de primeira geração, discípulos de Keynes, aos componentes da Escola de Cambridge, Roy Harrod, Joan Robinson e Nickolas Kaldor, e aos economistas pós-keynesianos que estudaram o crescimento com limitação pelo lado do balanço de pagamentos, especialmente Anthony Thirlwall.

Ao estudar os modelos keynesianos, Oreiro os classifica em dois grupos segundo neles exista ou não exista neles oferta ilimitada de mão de obra, e é também esse critério que utiliza para distinguir as economias maduras das economias em processo de industrialização. Nas economias maduras o crescimento econômico ou aumento da produtividade do trabalho depende da capacidade de reduzir o hiato tecnológico. Depende, portanto, da capacidade do país de absorver a tecnologia mais avançada. O mesmo acontece no caso dos países em desenvolvimento, com a vantagem que é mais simples absorver do que desenvolver tecnologia nova. Assim, quanto mais o país investir em educação e em tecnologia, mais se desenvolverá e fará o catching up, mas desde que haja demanda para os investimentos que, por sua vez, criarão a demanda por pessoal mais educado. Nas economias maduras o desenvolvimento econômico depende do aumento da produtividade do trabalho que, por sua vez, depende da taxa de crescimento do estoque de capital por trabalhador. O progresso tecnológico ou o aumento da produtividade depende, portanto, dos investimentos. E esses dependem da existência de demanda efetiva, e não, como afirmam os neoclássicos, da poupança previa. Ora, como aprendemos com Keynes, existe nas sociedades capitalistas a tendência à insuficiência de demanda, o problema dos policymakers é garantir uma demanda efetiva sustentada. Assim, Oreiro assinala que a prática de se usar políticas altamente contracionistas, para lidar com choques exógenos, não é aconselhável em função dos seus efeitos de longo prazo sobre produto e emprego. Contrações de demanda agregada, se necessárias, devem ser pequenas e revertidas tão logo seja possível para mitigar as suas consequências adversas de longo prazo.

Já em relação aos países em desenvolvimento, onde há restrição externa e oferta ilimitada de mão de obra, o modelo central discutido por Oreiro no capítulo 4 é o modelo de Thirlwall. Nesse modelo o crescimento depende, como nos modelos anteriores, da redução da assimetria produtiva existente entre os países em desenvolvimento e os países maduros, a qual, por sua vez, depende do aumento das exportações, especificamente de manufaturados. Thirlwall formalizou seu modelo nos anos 1970 a partir do conceito de restrição externa formulado pelos economistas do Desenvolvimentismo Clássico nos anos 1940 e 1950 – a restrição externa se definindo pelo fato de a elasticidade renda das importações de bens primários pelos países ricos ser menor do que um, e a elasticidade-renda da importação de bens manufaturados pelos países em desenvolvimento ser maior do que um. Isto significa que o crescimento econômico dos países em desenvolvimento será sempre menor do que o crescimento de suas exportações, ou, em outras palavras, que o país em processo de sofisticação produtiva precisa de um esforço adicional para crescer. Coube a Thirlwall formalizar esse fato, que ficou chamado de lei de Thirlwall, e que se tornou canônica para os economistas pós-keynesianos, porque demonstra de forma clara e simples que o crescimento é puxado pela demanda, e, em especial, pelas exportações.

Mas de que depende o crescimento das exportações? Supondo que os termos de troca estejam constantes, Oreiro, seguindo Thirlwall, informa que, dada uma taxa de câmbio por simplicidade considerada constante, a taxa de crescimento das exportações é igual ao produto entre a elasticidade-renda das exportações e a taxa de crescimento da renda do resto do mundo. Mas será que essa simplicidade é razoável? Não seria mais razoável supor que a elasticidade-renda da exportações é uma variável endógena e tornar o crescimento das exportações função da taxa de câmbio e da variação da renda do resto do mundo? Sem dúvida, o que abre espaço para Oreiro apresentar uma tese central do novo desenvolvimentismo e sua macroeconomia desenvolvimentista: a do papel da taxa de câmbio não apenas na determinação das exportações, mas também dos investimentos.

O novo desenvolvimentismo é um sistema teórico que eu e um grupo de economistas desenvolvimentistas e pós-keynesianos vêm elaborando desde o início dos anos 2000. Nessa construção teórica José Luis Oreiro e Nelson Marconi participaram de forma significativa desde que eles se engajaram comigo em escrever Developmental Macroeconomics – livro publicado pela Routledge em 2014, e que está em vias de ser publicado em português . Logo em seguida, Oreiro escreveu este livro que pode ser considerado como um grande resumo da macroeconomia do desenvolvimento anterior ao novo desenvolvimentismo. Os principais modelos originais da macroeconomia do desenvolvimento que ele citou neste livro foram publicados entre os anos 1940 e 1970. Temos depois um vazio teórico, até que, nos últimos dez anos, os modelos históricos do novo desenvolvimentismo passam integrar a macroeconomia do desenvolvimento, tendo como foco não mais a taxa de juros e o déficit público, mas, no quadro de uma economia aberta, a taxa de câmbio e o déficit em conta-corrente.

Para evitar duplicação, Oreiro não reproduz aqui os modelos da macroeconomia desenvolvimentista: a tendência à sobreapreciação cíclica e crônica da taxa de câmbio, a doença holandesa, o valor e o preço da taxa de câmbio, a taxa de substituição da poupança interna pela externa, a crítica dos déficits em conta-corrente que implicam aumento de consumo, endividamento externo, crises financeiras cíclicas e baixo crescimento, e as exportações e o investimento como função da taxa de câmbio. Mas já no capítulo 4, o novo desenvolvimentismo se faz presente, quando Oreiro discute a doença holandesa e assinala a dependência dos investimentos da taxa de câmbio – algo geralmente ausente na teoria econômica, mas que está presente no novo desenvolvimentismo porque, ao contrário das teorias ortodoxas e heterodoxas, neoclássicas ou keynesianas, a taxa de câmbio não se limita a ser menos ou mais volátil; no novo desenvolvimentismo a taxa de câmbio, além de cíclica, tende a ser sobreapreciada cronicamente, ou seja, no longo prazo. Dessa maneira, não basta que haja demanda efetiva para que haja oportunidades de investimento lucrativo; é necessário, adicionalmente, que haja acesso a essa demanda, que depende de a taxa de câmbio flutuar em torno do equilíbrio competitivo. Nas suas decisões de investimento, as empresas levam em conta essa taxa de câmbio sobreapreciada e a projetam para o futuro. Torna-se, então, clara para elas a falta de competividade das empresas existentes e também das projetadas por empresários inovadores, não obstante elas adotem a melhor tecnologia disponível no mundo, e torna-se inevitável a decisão de simplesmente desistir de investir, ou apenas investir o mínimo necessário para manter moderna a planta produtiva. Para que as empresas competentes sejam competitivas sua taxa de câmbio deveria flutuar em torno do equilíbrio industrial, mas, dada a doença holandesa, a política de crescimento com poupança externa e a política de controle da inflação com o uso de âncora cambial, essa taxa tende a se manter sobreapreciada no longo prazo, apenas se depreciando de forma radical quando os credores externos perdem a confiança no país e a crise de balanço de pagamentos se desencadeia. Neste caso, assinala Oreiro, a sobrevalorização da taxa real de câmbio resulta em desindustrialização e redução da taxa de crescimento. Por outro lado, o autor observa que a estrutura produtiva do país e, por conseguinte, as elasticidades renda das exportações e das importações, não são constantes imutáveis, mas dependem da taxa de câmbio; mais precisamente, da relação entre o valor corrente da taxa de câmbio e a taxa de câmbio de equilíbrio industrial. Quando a taxa de câmbio está apreciada em relação ao equilíbrio industrial, que define qual é a taxa de câmbio competitiva, as empresas domésticas perdem mercado para as empresas estrangeiras, obrigando-as a substituir uma fração crescente de sua produção por importações de componentes, o que as transforma em meros representantes comerciais das empresas estrangeiras.

No capítulo 6 Oreiro desenvolve ainda mais essas ideias. Para ele o essencial é que haja um regime de política macroeconômica export-led, consistente e sustentável, que seja capaz de conciliar a obtenção de uma taxa de inflação relativamente baixa e estável, com uma taxa real de câmbio competitiva e relativamente estável ao longo do tempo, uma taxa real de juros significativamente inferior à taxa de retorno do capital, um déficit público (como proporção do PIB) ciclicamente ajustado próximo de zero, e um crescimento dos salários reais aproximadamente à mesma taxa que o ritmo de crescimento da produtividade do trabalho. Em síntese, conclui Oreiro, “no modelo novo-desenvolvimentista, o crescimento econômico é puxado pelas exportações e sustentado pelo investimento privado e público na expansão da capacidade produtiva e na infraestrutura básica. O déficit público não desempenha nenhum papel relevante na indução e/ou sustentação do crescimento. Por fim, a estabilidade da distribuição funcional da renda assegura que os gastos de consumo irão crescer a um ritmo aproximadamente igual ao PIB real no médio e longo-prazo, garantindo assim a sustentação do ritmo de crescimento pelo lado da demanda doméstica”.

O fato de Oreiro enfatizar o caráter necessariamente export-led da estratégia de desenvolvimento visando o catching up incomoda muitos economistas desenvolvimentistas que opõem o modelo wage-led ao export-led, e optam pelo primeiro porque assim se estaria reduzindo a desigualdade. Existem três equívocos nesse ponto. Primeiro, a alternativa wage-led versus export-led é equivocada para países de renda média, que já têm uma indústria importante. Adotar uma política wage-led nessas circunstâncias é inviável, a não ser que queiramos voltar a ter altas tarifas de importação e voltar ao modelo de substituição de importações. Segundo, como os novos-desenvolvimentistas partem de uma taxa de câmbio sobreapreciada no longo prazo, quando o governo logra deslocar a taxa de câmbio para o equilíbrio industrial eliminando a desvantagem competitiva da indústria, haverá necessariamente um aumento de exportações de manufaturados, o coeficiente de abertura da economia aumentará, e teremos um modelo export-led. Terceiro, se definirmos as estratégias de crescimento como wage-led, equilibrada, e export-led de acordo com o critério de o coeficiente de abertura de economia estar diminuindo, estável, ou crescendo, a estratégia será export-led apenas em um primeiro momento, até que o país chegue ao coeficiente de abertura que corresponde ao tamanho de seu mercado e às tecnologias disponíveis. A partir daí, será equilibrado. Mas não seria o modelo export-led concentrador de renda porque a depreciação inicial reduzirá salários? Não em relação à renda dos rentistas, porque, assim como os salários reais, também os juros, dividendos e aluguéis reais diminuirão um pouco. Sim, em relação ao lucro das empresas, mas esse é o objetivo da desvalorização: tornar a taxa de lucro esperada mais elevada ao eliminar a desvantagem competitiva causada pela sobreapreciação crônica da taxa de câmbio.

Mas Oreiro não se limita a assinalar que a estratégia de desenvolvimento deve ser export-led e baseada no aumento dos investimentos para que haja alcançamento. Ele salienta que o que realmente interessa é o aumento das exportações de bens manufaturados, porque é no setor industrial que existe o maior potencial de aumento da produtividade; porque a exportação bem sucedida de bens manufaturados é um sinal claro que a competitividade do país não é apenas monetária (garantida pela taxa de câmbio); é também real, garantida pela melhor tecnologia disponível no mundo. Mas nosso autor assinala uma outra razão: o setor industrial está mais sujeito ao aumento da produtividade do que o setor primário-exportador e o de serviços. Essa é uma tese fundamental do desenvolvimentismo clássico ou estruturalismo que foi formalizada por Kaldor e Verdoorn, desde os anos 1940, e transformou-se em um referencial teórico básico para os economistas brasileiros pós-keynesianos. A ideia é simples e clara: uma aceleração do ritmo de crescimento da produção industrial está associada a um aumento do ritmo de crescimento da produtividade do trabalho, porque existem na produção industrial economias dinâmicas de escala. É claro que existem também economias de escala nos demais setores da economia, mas na indústria elas seriam maiores. Este é um bom argumento a favor da industrialização, ou, como prefiro hoje dizer, a favor da sofisticação produtiva, ou seja, do processo de aumento da produtividade do país. Mas não me parece que sejam as economias dinâmicas de escala o fator mais importante. Mais importante é a existência de setores produtivos com diferentes índices de valor adicionado per capita, que são determinados pela maior ou menor sofisticação tecnológica envolvida, e que se expressam no pagamento de salários maiores. Dado este fato, o aumento da produtividade do país depende do aumento da produtividade em cada setor, devido ao progresso técnico que nele ocorre, e depende da transferência de mão de obra de setores menos sofisticados para setores mais sofisticados tecnologicamente. Não é simples definir qual dos dois tipos de aumento da produtividade é mais importante, mas estou convencido que a resposta está nos setores com maior sofisticação produtiva.

No último capítulo Oreiro aplica a teoria que desenvolveu para fazer uma breve e precisa análise da economia brasileira no período recente. Poder-se-ia argumentar que esse capítulo poderia ser deixado de lado, dado o caráter teórico de todo o livro. Mas a teoria keynesiana e novo-desenvolvimentista é uma teoria histórica, que só vale na medida em que ela está permanentemente sendo testada pela prática. Para entender o quadro brasileiro Oreiro parte do tripé ortodoxo que foi deixado pelo governo Fernando Henrique Cardoso, assinala que ele foi modificado ou flexibilizado pelo governo Luís Inácio Lula da Silva, que, beneficiado por um boom de commodities, logrou uma aceleração da taxa de crescimento. Em 2008, a crise financeira global levou o país a realizar uma expansão fiscal contracíclica bem sucedida. Mas ainda nesse governo ocorreu uma brutal apreciação cambial que, conjuntamente a uma alta taxa de juros, praticamente inviabilizou o governo Dilma Rousseff, cujas taxas de investimento e de crescimento estão muito baixas. É verdade que esse governo logrou, nos primeiros dois anos, uma redução da taxa de juros, ao mesmo tempo em que ocorria uma desvalorização real, mas foi insuficiente para restabelecer a competitividade da indústria. A inflação, entretanto, cresce em função da expansão fiscal e da desvalorização. O que, somado ao baixo crescimento, foi suficiente para que o setor financeiro-rentista se organizasse e obrigasse o governo a recuar, voltando a aumentar a taxa de juros básica. Oreiro conclui que o regime de política macroeconômica desse período foi incompatível com a obtenção simultânea de uma taxa real de câmbio competitiva e uma taxa de inflação baixa e estável, foi produto do que denomina “desenvolvimentismo inconsistente”. E conclui o autor sua grande narrativa teórica e prática: “Nesse contexto, a única forma de recuperar o potencial de crescimento da economia brasileira é recuperar a competitividade da indústria de transformação, o que passa obrigatoriamente pela desvalorização da taxa real de câmbio. Como a taxa real de câmbio é definida como sendo igual a razão entre o preço dos bens comercializáveis e o preço dos bens não comercializáveis, a desvalorização da taxa real de câmbio exige uma redução da demanda por bens não comercializáveis, notadamente serviços. É aqui que o ajuste fiscal se torna absolutamente necessário. Enquanto a inflação dos bens não comercializáveis – que roda atualmente em torno de 8% ao ano – não ficar abaixo da inflação dos bens comercializáveis, o ajuste da taxa real de câmbio será impossível, independente da taxa de desvalorização do câmbio nominal. Em outros termos, a desvalorização do câmbio nominal só servirá para alimentar as pressões inflacionárias latentes na economia brasileira, fazendo com que, em algum momento nos próximos anos, a taxa de inflação supere a marca psicológica dos dois dígitos. Se isso ocorrer, então as condições para o retorno ao passado inglório da inflação alta estarão postas, via reativação dos mecanismos de indexação de preços e salários”.

Eis aí o que nos conta José Luis Oreiro neste livro em que é antes de mais nada teórico, mas que termina de maneira prática e objetiva. Um livro que, pelo seu alto nível de abstração e pelo domínio da teoria econômica que revela, destina-se apenas a economistas e a estudantes de economia. Um livro que é também uma grande e fascinante narrativa que me fez pensar em uma metáfora. Nessa narrativa existem dois heróis, o empresário e o investimento; sua espada, a taxa de câmbio; dois inimigos, a taxa de juros e o déficit em conta-corrente; um objetivo, o crescimento econômico com aumento dos salários; um campo de batalha, o mercado; dois limites a não serem ultrapassados, a inflação e o déficit público; e um árbitro enviesado, a favor do crescimento balanceado e sustentável no longo prazo, o Estado Desenvolvimentista, que precisa complementar o investimento privado e garantir as condições da acumulação privada de capital. Por enquanto nosso herói está em desvantagem, sua espada está embotada, e os dois inimigos estão ganhando. Por que? Porque o poder do setor financeiro-rentista é muito grande; porque a elevada preferência pelo consumo imediato dificulta tornar a taxa de câmbio competitiva e a poupança pública, positiva; porque, quando no poder, tanto os economistas pós-keynesianos e desenvolvimentistas quanto os economistas liberais ou neoclássicos têm errado muito. Por incapacidade de enfrentar os interesses, pela incapacidade de criticar a teoria econômica ortodoxa, pela alienação em relação aos interesses nacionais, por incompetência? Creio que um pouco por cada uma dessas razões. Mas quando vejo um economista jovem, na força da idade, como é José Luis Oreiro, escrever um livro desta qualidade, vejo que o pensamento ainda está vivo no Brasil.